sexta-feira, 27 de março de 2020

Com medo e sem estimativas, médicos e enfermeiros contam colegas infectados


Cleber Souza e Luisa Picanço
Do UOL, em São Paulo, e colaboração para o UOL, no Rio
27/03/2020 04h03
"Ontem morreu um agente de saúde suspeito de coronavírus no Hospital Getúlio Vargas. Digo suspeito porque não tem teste para os profissionais de saúde."
Nos hospitais do Rio e de São Paulo, há medo, cansaço e súplica por materiais de proteção, segundo retratam os sindicatos de médicos e enfermeiros entrevistados pelo UOL.

Apesar da imprecisão na contagem, começam a surgir casos de profissionais da saúde infectados. "Pelas nossas contas, já temos 80 profissionais em quarentena", afirma Mônica Armada, presidente do Sindenfrj (Sindicato dos Enfermeiros do RJ) e autora da frase que abre a reportagem. Em São Paulo, os sindicatos da classe já denunciaram instalações precárias ao Ministério Público e ao Ministério do Trabalho, além de entrar com ação contra o governo do estado no Tribunal de Justiça pedindo melhores condições de proteção dos profissionais. A reportagem do UOL tem entrado em contato com as secretarias estaduais, que afirmam estar usando todo o recurso disponível e atendendo às demandas, mas têm dificuldade em passar dados precisos sobre a demanda atual em relação aos leitos disponíveis. "Governo e município não vão passar dados sobre falta de EPIs [Equipamento de Proteção Individual, traje médico], pois realmente estão em falta", afirma Solange Caetano, presidente do Seesp (Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo).
No Rio, a Justiça do Trabalho concedeu liminar ao sindicato dos médicos sob pena de multa às organizações sociais e empresas públicas que prestam serviço ao estado e ao município do Rio. A determinação é de que se garanta o fornecimento de EPIs e insumos como álcool 70%, sabão e papel toalha. "Sabemos que tem hospital quem não tem sabão. Os profissionais estão expostos. O trabalhador tem de ser resguardado. Temos recebido muitas denúncias.", diz Alexandre Telles, presidente do Sinmed (Sindicato dos Médicos do RJ).

Falta mão de obra:
Limitações de estrutura e pessoal já se colocam como barreira à vista para enfrentar a pandemia, com número de contágios que deve crescer ainda no Brasil. Os sindicatos pedem contratações. "Não tem gente para trabalhar. Precisamos de contratação imediata. A prefeitura fez um chamado para 200 pessoas em enfermagem, mas só no [hospital] Souza Aguiar precisa de 111 pessoas", diz Monica, do Sindenfrj.
De acordo com dados do CFM (Conselho Federal de Medicina), em 2018, o Rio de Janeiro tinha 59.366 médicos e uma razão médico por 1.000 habitantes de 3,55.
No mesmo ano, São Paulo tinha 126.687 profissionais e uma razão médico por 1.000 habitantes de 2,81.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda a proporção de um médico para cada mil habitantes.
O Seesp afirma que a falta de profissionais nos hospitais está esticando a jornada dos contratados. Além do cansaço, é um maior tempo de exposição ao coronavírus em meio à falta de material de proteção. Máscaras que deveriam ser descartadas estão sendo utilizadas muito além do recomendável, revelam os profissionais de saúde.
Para o diretor do Sinmesp (Sindicato dos Médicos de São Paulo), o infectologista Gerson Salvador, o número de leitos de UTIs pode ser insuficiente caso a pandemia confirme uma evolução agressiva no estado. Para Solange, mesmo com as adversidades, o pânico ainda não começou. "Se isso se agravar, pode haver uma dificuldade quanto ao acesso à materiais de proteção. Principalmente para profissionais de saúde.”

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