segunda-feira, 27 de abril de 2015



O QUE ESPERAR DA ENFERMAGEM BRASILEIRA?

Há muito tenho ouvido falar sobre o papel da Enfermagem na sociedade. Passei semestres inteiros estudando a evolução do seu conceito, como eram vistas as pessoas que compunham a sua força de trabalho e, principalmente, como a sociedade percebia as atividades da Enfermagem.

Dentre os vários períodos históricos pelos quais passamos, aquele denominado Idade das Trevas sempre me chamou a atenção. Uma figura no surrado livro de História da Enfermagem retratava mulheres bêbadas durante o exercício da assistência. E despertava em mim, ávido estudante de graduação, uma vontade louca de voltar no tempo e organizar toda aquela bagunça. A mesma vontade que eu sentia de mandar de volta para as seleções dos vestibulares aqueles estudantes que diziam estudar Enfermagem porque foi mais fácil passar na prova ou que os pontos obtidos no vestibular só foram suficientes para conseguir vaga nesse curso.
Ainda mais irritante era ter que ouvir um trágico “eu queria ser Médico (a), mas não tenho condições financeiras para tal. Por isso fiz Enfermagem”.
Enquanto vivia os apuros de minha graduação, cansei de ouvir fatídicos “Enfermagem? Mas você é tão inteligente! Por que não faz Medicina?” ou “Por que você não se esforça para estudar mais e ser médico?”. E tudo aquilo foi formando no meu inconsciente um portfólio da imagem que as pessoas tinham da profissão que eu havia escolhido pra mim.
Em tempos de fácil acesso aos ambientes acadêmicos, por questionáveis e obscuros meios – negligentemente aprovados pelo Ministério da Educação – a seriedade da formação acadêmica em Enfermagem é muitas vezes posta em cheque. Como ser um ótimo profissional se a faculdade na qual você recebeu a graduação não oferecia condições mínimas de aprendizagem? Como ser levado a sério se, quando confrontado com um ventilador mecânico de ultima geração, o profissional não sabe sequer o que fazer para ligá-lo, pelo simples fato de que, na faculdade, o único modelo disponível para prática era uma foto de um imenso e ultrapassado ventilador de uma UTI fadada ao fracasso assistencial?
O que, afinal, esperar da Enfermagem nos próximos anos, décadas ou séculos?
Apesar dos desencontros na sua estrutura/essência, a Enfermagem tem feito Ciência. E nada melhor que a Ciência incrustada no âmago de uma profissão para torná-la reconhecida como essencial e primorosa. A Enfermagem é, atualmente, uma das maiores produtoras de conhecimento científico do planeta. No Brasil, dentre todos os setores da área da saúde, a Enfermagem é campeã de produção científica.
Entre 2007 e 2009, a produção científica de enfermagem brasileira registrada pelos 35 programas de pós- graduação no sistema de avaliação da CAPES correspondeu a 5.194 artigos publicados em 595 periódicos. As autorias totalizaram 7.173, sendo 88,1% em periódicos e 11,9% em livros e capítulos de livros. No triênio, foram defendidas 1.517 dissertações de mestrado e 377 teses de doutorado. Os quantitativos da produção nos advertem para a necessidade de problematizar a utilidade social do conhecimento de Enfermagem e o compromisso em transformá-lo em bem-estar das pessoas, grupos e coletividades.

Quanto à difusão científica, o Fórum de Editores de Periódicos de Enfermagem da Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), desde sua criação, nos anos 1990, tem contribuído para a melhoria da qualidade dos periódicos. No ano de 2010, dos 112 periódicos científicos internacionais na Web of Science editados no Brasil, quatro são de Enfermagem: Revista Latino-Americana de Enfermagem, Revista da Escola de Enferma- gem da USP, Acta Paulista de Enfermagem e Texto & Contexto-Enfermagem. No ano de 2009, a visibilidade internacional da produção cientifica de Enfermagem brasileira foi marcada pela sexta posição no ranking mundial do SCIMAGO (Fonte: CABRAL, I. E.)
As recentes campanhas para esclarecimento do papel de cada categoria que compõe a Enfermagem, bem como a valorização do conhecimento e especialização entre os seus profissionais é um ponto a favor na evolução dessa Ciência/Arte.
Só nos falta a valorização e reconhecimento pela sociedade e a conscientização por parte dos estudantes e profissionais de Enfermagem a respeito do seu importante papel na promoção, recuperação e manutenção da saúde da população, bem como na prevenção de agravos.
Muito se fala sobre os fatídicos “erros fatais” dos profissionais de enfermagem. A midia inteira faz questão de divulgar amplamente que um (a) enfermeiro (a) fez isso ou aquilo para “matar” um paciente. Mas por acaso alguém dessa famigerada midia se preocupou em analisar as condições de trabalho dos profissionais em questão? De alguma forma se preocuparam em entender os motivos sócio-ambientais que circundam o erro? Ou sequer pararam para diferenciar a categoria à qual pertence o tal profissional? Não estou aqui para defender erros de ninguém. Mas será que custa tanto investigar a fundo o que realmente se passa na vida de um profissional de enfermagem no Brasil?
Vou além ao questionar: será que a midia se interessa em noticiar a conquista que a equipe de enfermagem de determinada instituição obteve ao conseguir eliminar as ulceras por pressão que assolavam os pacientes de uma UTI? Ou acaso noticiam a simples presença de um profissional de enfermagem que aliviou a dor (física e emocional) de um grande queimado com aconchegantes compressas de soro gelado e reconfortantes “Está tudo bem agora! Pode apertar a minha mão, se quiser!”?

Certamente, não noticiam!
No dia em que a Enfermagem brasileira conseguir entender o que representa para o seu país e se valorizar/orgulhar por isso; e atuar de forma consciente, baseada em todos os princípios científicos que subsidiam as teorias da assistência; e que se respeite; e que respeite o próximo; e que veja nas equipes que a compõe seus verdadeiros aliados; e que a sociedade entenda o valor de cada profissional; teremos então a Enfermagem que sonhamos e pela qual esperamos ansiosamente.
Fonte: http://saladeenfermagem.com/2012/01/12/post-inaugural-o-que-esperar-da-enfermagem-brasileira/ 

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